quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Uma ponte suíça entre Brasil e China


09/02/2017 - Valor Econômico
A aquisição da Syngenta pela ChemChina por US$ 43 bilhões, que ainda depende do aval das autoridades regulatórias, terá impacto positivo nas exportações agrícolas brasileiras ao mercado chinês, afirmou o presidente executivo da multinacional suíça, Erik Fyrwald, ao Valor.
"A ChemChina está nos comprando [a Syngenta] por razões estratégicas para a segurança alimentar chinesa", disse ele. "E a ideia é incrementar a colaboração na cadeia de valor com o Brasil, fornecendo 'inputs' aos agricultores. Quanto mais produtivos, com novas tecnologias, mais esses agricultores poderão exportar para a China".
O Brasil, que lidera as exportações de soja em grão e açúcar para a China, é o segundo maior mercado para os defensivos e sementes da Syngenta, com participação de cerca de 20% no faturamento total da empresa.
A compra da multi suíça representará o maior investimento global feito até agora por uma companhia chinesa. É especialmente importante para Pequim ter acesso a um portfólio expressivo de produtos químicos e sementes patenteadas para reforçar o fornecimento de alimentos para sua enorme população.
Para ilustrar a importância do mercado brasileiro - o maior do mundo do segmento de defensivos - na estratégia dessa transação, Fyrwald contou que o Brasil foi o único país, além da China, que ele e o chairman da ChemChina, Ren Jianxin, visitaram juntos até agora.
Os dois executivos estiveram no Brasil em outubro, quando conversaram com companhias agrícolas e produtores rurais "sobre como colaborar e ampliar a conexão Brasil-China". Para o presidente da Syngenta, todos os lados ganharão com isso - a chamada "win-win situation".
"Não há nada comparado ao Brasil no mundo", disse Fyrwald. "O tamanho das fazendas, a produtividade, a consistência do clima, as colheitas múltiplas, tudo isso faz do Brasil um país incrível e com ainda mais potencial".
Segundo ele, a Syngenta vai continuar investindo bastante no país, melhorando sistemas e capacidades. "Estamos absolutamente comprometidos em fortalecer nossa posição no mercado brasileiro e ajudar na ponte com a China".
Fyrwald se mostrou confiante de que a transação de US$ 43 bilhões será concluída no segundo semestre deste ano. Ele observou que o exame pelas autoridades regulatórias tem demorado mais que o previsto, mas disse acreditar que isso não tem a ver com desconfianças em relação à aquisição de tecnologias pela China ou uma eventual situação dominante criada pela transação.
Também a fusão entre as americanas DuPont e Dow Cheminal, que resultará em uma companhia de valor de mercado de cerca de US$ 130 bilhões, e a compra da americana Monsanto pela alemã Bayer, anunciada em setembro por US$ 66 bilhões, reforçaram o monitoramento dos governos nesse mercado.
Se as negociações forem concluídas, os três grandes grupos que emergirão serão responsáveis pelas vendas de 62% das sementes patenteadas no mundo e também por mais de 60% de todos os defensivos comercializados, segundo analistas.
Para Fyrwald, é unicamente a mudança do perfil da concorrência nesses segmentos que tem retardado as decisões das autoridades. No caso da Syngenta, uma das discussões com autoridades regulatórias da União Europeia envolve a cessão de alguns produtos cujas patentes já expiraram. Eles representam 65% do faturamento da companhia suíça, ante os 35% dos produtos patenteados.
Até agora, 13 autoridades regulatórias deram sinal verde à aquisição. Mas faltam as de Brasil, Canadá, China, UE, Índia, México e EUA.
Fyrwald insistiu que a inovação continuará a ter papel fundamental para a Syngenta. Quanto aos temores sobre aumentos de preços por causa da concentração no segmento, o executivo evitou especulações e disse que as autoridades examinarão a questão para que a concorrência continue adequada.
Ele espera que uma aprovação pelos EUA e pela UE, em abril, facilite o aval do Brasil em tempo para não atrasar a conclusão da compra, prevista para até o fim de junho. E afirmou que não acredita que a recente onda contra investimentos chineses tanto na Europa como nos EUA vá afetar a Syngenta. E se disse "otimista" mesmo diante da retórica protecionista de Trump e das ameaças do novo presidente americano à China.
Para Fyrwald, o novo embaixador americano na China, o ex-governador do Iowa Terry Branstad, e o novo secretário de Agricultura, o ex-governador da Georgia Sonny Perdue, sabem que para os agricultores americanos a exportação é uma questão crítica e vão trabalhar para manter os mercados abertos.
A Syngenta anunciou ontem que suas vendas globais alcançaram US$ 12,8 bilhões em 2016, 5% menos que em 2015. O lucro líquido da empresa caiu 12% na comparação, para US$ 1,2 bilhão. Mas o desempenho foi considerado positivo, já que foi ano difícil para a indústria agroalimentar e a rentabilidade dos agricultores permaneceu sob pressão em vários segmentos.
Na América Latina, o faturamento caiu 9% no ano passado. No Brasil, onde as vendas da múlti só são menores que nos EUA, as condições melhoraram no Cerrado no segundo semestre, mas se degradaram em outras regiões na medida em que a seca avançava em direção ao sul. As vendas de defensivos foram limitadas pelos elevados estoques, mas as de sementes de milho aumentaram.
A companhia elevou preços no Brasil para compensar a desvalorização do real em 2015 - e, no segundo semestre, foi beneficiada pela apreciação da moeda brasileira. Na divulgação de seus resultados, a Syngenta também destacou a melhora do ambiente de negócios na Argentina e confirmou que parou de vender na Venezuela, perdendo um negócio de aproximadamente US$ 75 milhões.
Apesar da piora dos números anuais de 2016, a Syngenta disse ter registrado resultados "encorajadores" no quarto trimestre do ano, quando houve alta de 7% no volume de negócios nas diferentes regiões. E, para 2017, a empresa mostrou muita confiança no Brasil. Destacou a melhora do clima no país, as condições de crédito menos ruins e a valorização da moeda.
Mas a multinacional continuou reclamando dos preços das commodities - que, em sua avaliação, seguem em baixos patamares. Erik Fyrwald destacou, em todo caso, que os preços pararam de cair e que a demanda global continua a crescer.

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